quinta-feira, 18 de junho de 2009

Eternamente


Precipitando-me de teu céu,
Após sentir tuas nuvens entre minhas penas,
Fui pedra em escrava queda rumo ao teu solo.
"Não há muito a fazer quando a vontade coincide com o destino"

Bicho renascido, percorri-te a terra, insaciável,
Cego de em tudo te ver e louco de nunca alcançar-te.
Comi-te os frutos, mas nada são sem que te sejam partes
E, à parte disso, continuaste inteira em tua distante boniteza.

Sedento de ti, enxerguei-te fonte a jorrar sem rumo,
E com humanas mãos em sangue, em teu chão abri-te caminho,
criei-te leito onde teu inquieto sono pôde correr de-vagar,
Cobrindo-me por completo com tuas águas.

E, nessa hora, fugindo-me toda a tua respiração dos pulmões,
Preenchido de tua escuridão, estive morto e acordei,
caudaloso rio, desembocando eternamente em ti.

(Meu menino grande)

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009


"Puxada por ventos e palavras. (..) Eu sei das iluminações do ovo. Não tremulam por mim os estandartes. Não organizo rutilâncias. Nem venho de nobrementes. Maior que o infinito é o incolor. Eu sou meu estandarte pessoal. Preciso do desperdício das palavras para conter-me. O meu vazio é cheio de inerências."

(Manoel de Barros)

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Poema


"Te amo por sombrancelha, por cabelo, te debato em corredores branquíssimos
onde se jogam as fontes de luz,
te discuto em cada nome, te arranco com delicadez de cicatriz,
vou pondo em teu cabelo cinzas de relâmpago e fitas que
dormiam na chuva.
Nao quero que tenhas uma forma, que sejas precisamente o que
vem atrás da tua mao,
porque a água, considera água, e os leoes quando se dissolvem
no açúcar da fábula,
e os gestos, essa arquitetura do nada,
acendendo suas lâmpadas no meio do encontro.
Todo amanha é o quadro onde te invento e te desenho,
disposto a te apagar, assim nao és, muito menos com esse cabelo liso,
esse sorriso.
Busco tua soma, a borda da taça onde o vinho é também a lua e o espelho,
busco essa linha que faz o homem tremer
numa galeria de museu.
Além do mais te amo, e faz tempo e frio."
(Julio Cortázar)

domingo, 23 de novembro de 2008

Sereias brincam de atirar pedras na direção da praia,
só para vê-las rolar na areia.
A brisa colorida penetra nos olhos,
mudando a cor de todas as íris.
Arco-íris!
Ao longe, um peixe grande conta suas histórias aos pescadores,
que lhe ouvem incrédulos - "não existem homens de 4 metros!"
A borboleta blue na beira do cais não vê nada disso,
só as listras monocromáticas da sua camisa.
Pés inchados vestindo farrapos seguem em sua direção,
eles pertencem a um mendigo velho e cego,
que lhe dando uma esmola diz:
"está tudo bem!"

A borboleta e o cronópio

Passava uma lagarta por onde conversavam uma esperança, um fama e um cronópio.
Afastando-se com nojo, a esperança pediu que a matassem.
O fama, pronto a ajudar, correu a pisar na lagarta, como que dançando.
O cronópio, pondo-se entre o fama e a lagarta disse aos outros dois:
- Vocês também já foram sábios chineses!
Calaram-se e deixaram que a lagarta seguisse seu destino.
E acordaram todos borboletas!

(Meu menino grande)
... um cisco no olho é um meio de chorar,
que encontra quem não sente.
É um meio choro!

Quando não se sente o incômodo de sentir,
a dor física é um substituto excelente.
É um(a) me(i) culpa!

E o coração, há tempos pregado em alguma porta
de uma casa muito engraçada, caiu.
Cacos se espalham por todo o chão e alguns atigem o peito.

E às vezes, só às vezes,
os estilhaços no peito batem acelerado,
cortando tudo por dentro,
ou pedaços de coração arrastados pelo vento
acertam um olho que não sente, como um cisco...

(Meu menino grande)

A construção de Mme. Butterfly

Dentro do coração,
entre ecos de Bethânias,
uma pequena borboleta,
estranha no ninho,
se entranha nas horas,
fazendo delas sua casa.

Uma casa sem teto e sem fim,
que é toda porta e janela,
tecida de carinho e afeto
pra ela e pro seu pierrô-arlequim.
E que aumenta no dia-a-dia-a-dia-a-dia...


(Meu menino grande)